domingo, 9 de março de 2008

AFINAL POSSO DIZER QUE SOU PROFESSOR!


“ … não analisam o que dizem e a maneira de dizer. Já esqueceram há muito os alunos a quem deveriam transmitir o saber e o exemplo de cidadania que já não conseguem ser. Os professores perderam o norte.”
José Gil Serôdio, in “O Torrejano” de 7 de Março de 2008

“ … as escolas são talvez o mais firme reduto das esquerdas… e que o PCP é o mais forte poder instalado nas estruturas representativas…. Mas o eleitorado depressa reconhecerá a atitude de firmeza e razoabilidade que a ministra da Educação tem apresentado…”
Fernando Madrinha, in “Expresso” de 8 de Março de 2008

“ Desde que há democracia, não me lembro dos sindicatos terem deixado de exigir a cabeça do ministro ou ministra da Educação em funções. Começou com Sottomayor Cardia… hoje os professores são colocados com garantia de três anos no mesmo local. Este sistema educativo serviu para formar gerações de ignorantes, sem préstimo no mercado de trabalho de hoje. Eu se fosse professor estaria, no mínimo, incomodado com os resultados. No essencial, ela (a ministra) tem razão e todos nós, que não estaremos hoje a desfilar em Lisboa, já o percebemos.”
Miguel Sousa Tavares, in “Expresso” de 8 de Março de 2008


Confesso, eu fui um dos 100.000 professores que esteve na Avenida da Liberdade, ontem, dia 8 de Março de 2008, uma data que vai ficar cá dentro até ao final dos meus dias. Não estava muito entusiasmado com a ideia de ir a Lisboa, afinal tinha muita coisa para fazer em casa, uns testes para elaborar, a fim de testar os conhecimentos adquiridos pelos meus jovens amanhã de manhã e sabia que era um dia que me ia fazer falta, mas comprei o “Expresso” e recebi o “Torrejano” no hipermercado logo pela manhã. Confrontado com as pérolas literárias que reproduzo acima, nem hesitei, corri para o autocarro e só parei no Marquês de Pombal. Às vezes bendigo as crónicas do Miguel Sousa Tavares, o jornalista que manda umas “bocas” num qualquer telejornal, dono de um total e globalizante conhecimento que lhe permite discorrer sobre qualquer tema, tal qual o doutor Rebelo de Sousa, escreve as tais crónicas semanais do “Expresso” ou uns livros comerciais, bem produzidos (e nós sabemos bem a falta que faz a um escritor uma boa produção…) que alguns críticos invejosos disseram ter um deles sido escrito através de plágio, para concerteza receber pouco mais de 1500 euros mensais, como esses tais fomentadores da ignorância recebem por 35 horas semanais de actividade burocrático-pedagógica (falo por mim, "professor titular", com 36 anos de serviço). Já alguém se lembrou de saber o que pensam os cônjuges dos professores sobre a bela vida que levam?
Não sabia da posição radical de Fernando Madrinha, até porque ao longo dos anos o vi escrever de uma forma calma, responsável e partidariamente independente, como se exige a um jornalista, porque para tomar partido devia escrever para o Avante, o Portugal Socialista ou outro qualquer. A propósito sabe Fernando Madrinha que o seu “Expresso” subiu em Janeiro 3,5% quando a inflação era estimada em 2,1%? Não o vi escrever que estava contra os mais poderosos que têm a faca e o queijo dos preços na mão… mas deixemos para lá, que estamos a falar de professores.
Do Gil Serôdio, não poderei dizer muito, apenas que deve ter tido professores que não lhe transmitiram o saber que hoje empresta aos textos que escreve, nem lhe serviram como exemplo de cidadania. Uma lástima estes professores…
Pois meus caros, não sei se conhecem o dia a dia de uma escola, não sei quantas vezes os três escribas acima mencionados têm entrado nas escolas públicas portuguesas nestes últimos anos, mas sempre lhes digo que têm saído das escolas públicas os excelentes técnicos que enchem o país de empresas dinâmicas e competitivas, os inventores da via verde, dos carros movidos a electricidade (e o governo assobia para o lado, como é o caso da Universidade de Aveiro), dos jogos de computadores, do software informático, dos laboratórios químicos, da programação, dos jovens estudantes que entram em medicina nas principais universidades europeias, dos jovens escritores, dos jovens investigadores espalhados pelos maiores centros científicos da Europa e América, dos jovens músicos (e o governo a querer mexer no que está a funcionar bem…).
Por mim, professor, sei bem a diferença entre os 20% dos jovens do secundário de há 30 anos e os 95% dos jovens do secundário de hoje em dia, mais abertos, mais inteligentes e mais desenvolvidos. Podem não saber a “linha da Beira Alta”, mas são uma geração aberta ao novo e moderno conhecimento.
Quanto aos professores, são uma classe profissional com um elevado nível científico-pedagógico, como é exigido nos dias de hoje, tentam todos os dias desenvolver estratégias positivas para melhorar o nível dos seus alunos, embora alguns desses jovens não queiram nada com a escola. Acreditam os críticos que os professores têm prazer em reprovar os seus alunos?
Uma avaliação do trabalho docente desenvolvido sem subterfúgios, onde os melhores vejam reconhecido o seu trabalho, uma gestão escolar onde aos responsáveis sejam concedidos os meios necessários a um trabalho gratificante, sem orçamentos que só dão para pagar a água, luz, telefone e papel higiénico, quando dão, um estatuto do aluno que lhe dê mais responsabilidade nos direitos e deveres, uma escola que tenha o apoio e a presença efectiva dos pais e encarregados de educação nos seus órgãos (sabem que cerca de 90% dos pais dos alunos do secundário nunca foram à escola dos filhos?).
Que melhor exemplo de cidadania e de responsabilidade social e educativa que aquele desfile de 100.000 professores na cidade de Lisboa? Tive oportunidade de participar e observar tantos e tantos milhares de colegas e vi que não podia estar ali uma corporação a defender privilégios. A atitude colectiva era apenas a exigência de respeito e dignidade a uma classe de que me orgulho de pertencer.


4 comentários:

Miguel Sentieiro disse...

Do melhor...

Só aquela parte dos 95% dos alunos serem mais inteligentes e desenvolvidos, ...tens de apanhar um CEF p'ró ano para veres até onde vai o desenvolvimento da calanzice.

Abraço
Miguel

virginia disse...

Só lamento que os profs só se sintam com 25 anos de atraso...
primeiro... foram os trabalhadores do campo, depois os da industria e agora... aqui estais vós! Uma unidade, sim... mas elitista. Qdo os outros perseguidos precisaram de vós onde estavam? A grande maioria de vós nunca esteve solidário com a luta que vos antecedeu, mas... é sempre a mesma LUTA! Obrigada!

vitorpt disse...

Os professores só exigem respeito pela sua função educativa e social. Quando fôr dinheiro nós avisamos.
É que eu até respeito as funções do portageiro da BRISA e mesmo pagando contrariado, digo sempre "bom dia!" e recebo "boa viagem!". Mas é claro que não tenho que ir nas manifs dos trabalhadores rurais ou da indústria... ou será que tenho? fica a dúvida.

Anônimo disse...

Agradeço o seu comentário ao qual respondi na nova morada (blog.sapo.pt.)