terça-feira, 25 de novembro de 2008

SIMULACRO

O país viveu e continua a viver um terramoto, o que deu aso a que uns entendidos na matéria promovessem acções de combate a este flagelo, através de um globalizante simulacro... nem queiram saber o que aconteceu com esta brilhante iniciativa governamental, onde entre mortos e feridos alguém tentou escapar.
As ambulâncias que insistiam não ter dinheiro para o gasóleo necessário ao transporte de doentes, apareceram de todos os lados com o depósito atestado, os voluntários mortos e feridos cheios de pensos e mercurocrómio, por entre a curiosidade do pessoal que ia espreitando a azáfama de um tremor de terra de 4 graus na escala de Richter. Acho até que podiam ter feito as coisas para que a escala subisse um pouco mais, mas depois tinham que transportar mais mortos e feridos, o que mesmo para simulacro ainda iria cansar o pessoal e não é tempo de confundir a ficção com a realidade... mas será que isto é mesmo simulacro?
É que pareceu-me ter lido que os bancos que tinham lucros fabulosos de milhões e afinal estão quase todos falidos, que o petróleo baixou para menos de metade e os combustíveis só baixam nos depósitos, que 120.000 professores foram para a rua e a ministra quer mesmo pô-los na rua, que os funcionários do Estado viram os salários congelados três anos e o deficit das contas públicas aumentou, que o Benfica já contratou 325 jogadores internacionais e não consegue ganhar nem uma taça de champagne, que o primeiro-ministro tirou uma licenciatura ao fim de semana e agora querem fechar a universidade independente a semana toda, que os políticos fazem negócios com as empresas e quando saem do governo vão para a administração dessas empresas, que os polícias prendem os criminosos durante o dia e à noite vão fazer segurança nas discotecas desses mesmos criminosos, que os juízes julgam que julgam e os arguidos julgam que não, que a esquerda é de direita quando a direita pensa que é de esquerda, que...
Mas este simulacro de democracia, com possíveis interlúdios de seis meses para repôr a ordem é real ou também faz parte do simulacro?
E o governo faz parte da realidade ou é um grupo de voluntários dispostos a mandar uns foguetes e a apanhar as canas, confundindo tudo e todos e arranjando expedientes cada vez mais simulados, descobrindo milhares de milhões de euros de garantias para equilibrar os orçamentos de bancos e de administradores que de finanças só se lembram de ter jogado o "monopólio" em pequeninos?
Continuando os simulacros, fui confrontado hoje na minha escola com um incêndio fictício, campainhas a tocar a todo o vapor, carros de bombeiros a apitar e carros da GNR com os pirilampos ligados, socorro que já estava na escola ainda antes do "incêndio" ter sido deflagrado, numa antecipação que nem o Zandinga ou o Professor Bambo alguma vez tinham previsto e com os alunos a sair ordenadamente para uma zona de segurança que inacreditavelmente se situava ao lado do depósito de gás.
Será que amanhã tudo volta ao normal, ou esta crise também faz parte do simulacro?

CORPOS

O medo de não poder dizer
o que tenho aqui dentro...
o vulcão desta capa que rebento
em momentos de calor e de paixão,
a calma que sucede à confusão
e nos dá em cada dia mais prazer.

O corpo eterno do teu céu,
tão longe, tão puro, tão quente,
deixa em Deus palavras, somente
a construção do livro mais antigo,
palavra por palavra do que digo,
a marca que tricotas em teu véu.

A espuma que nos molha sem querer,
por paixão ou loucura, ninguém sabe,
fruto de uma enorme vontade
de abrir nossos corpos num sentido,
desejo de um jogo em meu destino,
vivido no além do teu querer.

domingo, 23 de novembro de 2008

A FALTA DE IMAGINAÇÃO...

Todos os dias somos confrontados com notícias, reportagens, crónicas, livros e revistas onde a imaginação entra em rédea solta e ainda há quem consiga alinhavar tanta quantidade de imaginosas recomendações, análises, contas-correntes, projectos, programas, acções e outras confusões, mas infelizmente eu não consigo, porque quando vejo um administrador a confirmar alhos, vem logo outro no dia seguinte refutar bugalhos, se um diz que falou o outro diz que não ouviu, se havia lucro para este, vem logo o prejuízo do outro... como se pode ser sacristão numa igreja destas?
Então não é que fui bombardeado nos últimos anos com lucros, eu repito, com lucros multimilionários de todos os bancos deste país e agora vêm todos dizer que estão tesos que nem a espinha do carapau? mas será possível que um administrador de um banco venha dizer que não sabia de nada, que nem percebia de contabilidade, que a formação dele era direito e que assinava tudo porque o amigo lhe dizia que estava tudo bem, sem se lembrar quando o convidaram para a administração, que na verdade sabia tanto de administração de bancos como eu de lagares de azeite? mas eram 25 mil euros por mês e não era tão rico assim para dizer que não... afinal aquilo não era tão difícil como isso, todos os anos tinha lucro, porque não aceitar? podia ser burro, mas parvo só o da parvónia...
Mas se tinham lucro todos os anos e nunca quiseram pagar de impostos mais (em percentagem) que qualquer contribuinte, porque é que os meus impostos vão servir para os tirar do lamaçal financeiro em que se meteram? e como é que um administrador, que não sabe de nada, consegue tirar uns milhões de euros da sua conta antes do banco se queixar de dores nas costas, perdão, nas contas? o homem tem cá um olho para as suas contas que faz favor...
Cada vez que leio ou oiço estes banqueiros, lembro-me do Alves dos Reis, mas ao menos esse encheu o país de notas de quinhentos e estes enchem os seus bolsos e dos amigos, que até me recordam de quem leva a vida à sombra da bananeira e chego à conclusão de que "bananas" somos quase 10 milhões... o amigo administrador que dá procuração ao amigo, que lhe compra a casa, que depois é nomeado para um cargo pelo amigo, que entretanto sai do governo e vai para a administração do banco que já lá tinha os outros amigos que entretanto faziam negócios com as empresas das mulheres , que eram sócias do afilhado... acho até que a TVI podia começar a próxima telenovela com estes actores todos.
É claro que o país antigamente adormecia e acordava com a azia da aguardente branca nessa altura e sem possibilidade de muitas confusões, até porque se não havia cartões multibanco, muito menos havia contas no banco, mas agora é diferente, qualquer ex-político se junta a uma off-shore das Maldivas e investidores árabes ou angolanos, que têm o povo cheio de fome, mas fazem investimentos com dinheiro lavado com "omo" ainda mais branco...
Agora sim, esta maralha afaga os negócios com wisky velho, faz da vida um conjunto de novelos que impedem que se puxe a meada pela ponta, atam e desatam nós que os protegem a si e aos amigos, tornam-se inimputáveis... já repararam como o povo condescende com o fato, gravata e o putedo da Lux? o fato e a gravata são provas irrefutáveis de que esta gente é imaculada, cheira bem, fala baixinho, lava-se todos os dias, para além de aparecer sempre com bons carros, grandes e luxuosas vivendas, como aquela que a TV mostrou do administrador, comprada apenas com o lucro de negócios bem dirigidos, porque no governo o homem nem ganhava para os charutos, como dizia um tal ministro Gonçalves Perreirra que gostava de carregar nos erres... há até uma canção brasileira que diz " um rico correndo é atleta, um pobre correndo é ladrão"...
E diziam que os portugueses são pouco imaginativos...

sábado, 15 de novembro de 2008

MINISTERIAL AVALIAÇÃO

Ao longo dos anos tenho que reconhecer que não tenho muita legitimidade política para em letra de forma criticar os políticos, as políticas e tudo o mais que nos envolve, cultura afinal, porque é a cultura uma miscelânia de parâmetros que definem os povos e as nações, desde os regimes, as religiões, as raças (se é que existem), o género, sendo que até o desporto o é, não sendo... ou então essas frases que eu encontro nas carrinhas e autocarros desportivos ("ao serviço da cultura e desporto") estão erradas...
Dizia eu que ao longo dos anos as pessoas vão modificando a sua visão da vida e das coisas da vida, de tal maneira que umas vezes vêem tudo com enorme claridade e algum tempo depois está tudo turvo e nalguns casos chegam à cegueira total, o que me leva a olhar este e outros governantes como fotocópias cada vez menos legíveis do original que já não era grande coisa... e ao lembrar, por exemplo, a ministra da Educação Maria de Lurdes Rodrigues, chamo a atenção de um tal Sottomayor Cardia, ex-ministro da Educação nos anos 70, que tão mau como esta ministra, batia mal da bola e devia ter as lentes tipo "garrafa" desfocadas ou sujas, de tal maneira que uns anos mais tarde ainda queria ser Presidente da República, coitado.
Pois o tal Sottomayor, com dois tt, lembrou-se que havia mais de 20.000 professores sem habilitação própria e decidiu que não podiam estar no ensino, muito embora alguns deles fossem professores com dez, quinze ou vinte anos de serviço... esquecendo-se que só estavam nas escolas porque não havia pessoal habilitado, o que se comprovou com o concurso imediato que, por não haver professores habilitados em número suficiente, preencheu milhares de vagas com outros docentes sem habilitação. Fantástico este Cardia!
Hoje é a Educação, nas mãos da mesma família política, o principal alvo já não com a proposta de correr com essa maralha docente das escolas por falta de habilitação, mas por falta da avaliação que eles acham a "melhor do mundo"... só ainda não se lembraram de dizer que está conforme as directivas da União Europeia e dos acordos de Bolonha, pelo que o governo nem pode fazer nada, foram ordens de Bruxelas...
Ainda há dois anos criaram um PAM (Plano de Apoio à Matemática) que se iniciou no 7º ano de escolaridade e este ano já vai no 9º ano, mas uma vez que nos exames nacionais do ensino secundário do ano passado as médias subiram, vieram logo uns acólitos do ME dizer que já se notava o êxito da aplicação do PAM...
Claro que, a par da introdução de regras de assiduidade mais restritas aos professores, que condicionam sobremaneira a sua avaliação final e que obriga muitos deles a ir trabalhar doentes, é lógico que no final do ano o aproveitamento pode melhorar, até porque na generalidade das escolas já nem são necessárias aulas de substituição... mas é bom não esquecer que tudo isso acontece porque os professores estão a ser sujeitos a um trabalho que mais cedo ou mais tarde vai trazer problemas à classe e às escolas no seu conjunto.
Estranho até que a classe docente seja tão privilegiada em Portugal ("uns inúteis, bem pagos e que nada fazem", como afirmou Miguel Sousa Tavares) que, milhares de professores, quando saem das escolas para as autarquias, funções dirigentes, governo e apêndices, nunca mais voltam à escola onde se ganha bem e nada se faz... são todos missionários, não é?
Quando há uns anos quiseram dividir a carreira docente, com uma prova pública de avaliação para quem quisesse subir do 7º para o 8º escalão (ECD de 1989), o ministério acabou com essa treta, não porque achasse que os professores tinham razão, mas porque chegaram à conclusão de que não havia avaliadores-inspectores para tanta avaliação. Agora não caíram no mesmo erro da avaliação externa e ainda fizeram o espectáculo da avaliação dos "pares"... e mesmo assim não querem que os colegas façam a vossa avaliação? "malandros, vocês não querem é avaliação nenhuma!" Sócrates dixit.
Por fim, assistimos às tristes declarações de responsáveis políticos tentando "colar" os professores às gemadas dos alunos... perdoai-lhes Senhor que eles não sabem contar até 120.000!

domingo, 9 de novembro de 2008

A MILÚ IRAQUIANA

" Não cedemos a chantagem, nem a guerrilha eleitoral"
Com esta frase "brilhante" a ministra da Educação de Portugal quis responder aos mais de 100.000 professores que pela segunda vez desde Março deste ano se manifestaram em Lisboa, justificando os quase 90% de professores que se deslocaram desde Trás-os-Montes ao Algarve, com prejuízo de um dia inteiro de descanso para fazerem valer o seu ponto de vista neste diferendo.
Ao lembrar-me do seu passado maoista, veio-me à memória o "bando dos quatro" que poderemos compôr com José Sócrates, Maria de Lurdes Rodrigues, Valter Lemos e o secretário Pedreira, donos da verdade da educação nacional, da avaliação "tipo folha A4" porque se lembrou que afinal a avaliação dos professores corresponde a uma simples folha A4 com os objectivos individuais... que os ignorantes professores portugueses não conseguem preencher, porque na verdade eles nem conseguem fazer uma redacção com pés e cabeça, quanto mais uma avaliação sem pés nem cabeça.
Será que a ministra da Educação entende que os 100.000 professores se manifestaram para prevenir situações de injustiça a médio prazo, como a divisão da carreira, com classificações de bom, muito bom e excelente que vão diferenciar os anos necessários à subida de escalão e a ultrapassagem de uns pelos outros, não porque uns sejam melhores que outros, mas porque haverá em muitos casos dois professores excelentes e apenas uma vaga para preencher?
Será que a ministra da Educação entende que há professores de Educação Física que vão avaliar colegas de Educação Tecnológica, Educação Musical ou Técnicas de Expressão Plástica e que não estão minimamente preparados para fazer essa avaliação? e saberá que o contrário também acontece, com professores de Educação Visual a avaliar os colegas de Educação Física, até mesmo assistindo e avaliando a prática pedagógica?
Com que então só precisamos de uma folha A4 com os objectivos pedagógicos? veja lá, senhora ministra, que estes 100.000 loucos andavam a fazer reuniões intermináveis com 3, 4 e 5 horas de duração, só para elaborarem o planeamento anual, o projecto educativo, as avaliações diagnósticas, os quadros de percentagens em exel, os projectos curriculares de turma que, se os directores de turma não viessem com eles quase prontos para aprovação, ainda íamos fazê-los na noite de consoada...
E sabia, senhora ministra que as organizações de professores elaboraram um projecto de avaliação de professores capaz de ganhar esta classe profissional para uma melhoria do seu estatuto e do ensino em geral, projecto esse que a senhora diz ainda não ter recebido, quando a revista da FENPROF já o publicou?
Já agora gostava de referir que sou professor titular, fui nomeado avaliador de cinco colegas de grupo, com quem trabalho há mais de uma dezena de anos, nunca fui convidado a assistir a uma qualquer formação em avaliação, nunca me convocaram para uma reunião de avaliadores e apenas sei que terei de os avaliar porque me foi comunicado oralmente numa reunião geral de professores. Tive o cuidado de lhes comunicar que para uma vaga de excelente num departamento de 17 profissionais, não tenho capacidade para os diferenciar, o que pressupõe uma avaliação de bom para todos eles, porque eles são mesmo bons. Mas todos sabemos que outros departamentos podem catalogar de excelentes outros colegas tão bons como eles, não é senhora ministra?
Lembrei-me agora do ministro da propaganda de Saddam Hussein, que com as tropas americanas às portas de Bagdad, gritava para as cameras de tv que "a guerra está ganha e os americanos foram totalmente derrotados"... será que a ministra da Educação estará com as mesmas visões do cómico ministro do Iraque?
Vá-se curar, senhora ministra!